Compreender o cérebro humano e como utilizar modelos mentais durante o design, podem transformar a experiência dos usuários.
Quando falamos em evoluir a experiência dos usuários, independente da área de Design que estejamos focados, nos deparamos com diferenças possibilidades. Uma que se destaca é o processo/conceito de cognição por ter uma relação direta com experiência e nosso dia a dia.
A cognição, então, pode ser definida como ‘uma ação, ou processo, mental de aquisição de conhecimento e compreensão através de: pensamentos, experiências e sentidos’. Sendo assim, a cognição, possui diferentes processos mentais que iremos explorar e podem ser divididos em:
Atenção
Este é basicamente o nosso foco, nossa capacidade de nos concentrar quase que exclusivamente em apenas uma tarefa de cada vez.
Isto ocorre pois nossa cognição literalmente seleciona informações. Para compreender um pouco melhor como esta seleção ocorre, vamos pensar em dois triângulos, um representando uma corrente de processamento que se inicia de cima para baixo e outro onde a corrente é de baixo para cima.
No primeiro triângulo (cima para baixo) nossa atenção está direcionada aos nossos objetivos atuais. Por exemplo, ao procurar uma borracha em um estojo ignoramos totalmente as formas de canetas, lápis, apontadores e afins. Focamos, no entanto, em formas retangulares e com textura específica.
Já o segundo triângulo (baixo para cima) corresponde ao foco instantâneo. Pense em todas às vezes que estava concentrado em algo e de repente sua atenção se volta para um objeto caindo ou um barulho abrupto, este é seu foco / atenção instantâneo.
Contextualizando para sistemas virtuais, imagine pop-ups aparecendo do nada, ou — mais antigamente — entrar em um site e uma música de fundo começar a tocar. Estes são exemplos extremos, mas nos lembram que é necessário manter estímulos extremos no mínimo — ou utilizar nos momentos corretos.
Memória
A memória é responsável pelo processo de ‘codificação, armazenamento e recuperação da informação recebida pelos nossos sentidos.’ Ao analisar cada um destes passos individualmente podemos perceber o seguinte:
Codificação: Possui uma ligação direta com o recém-mencionado uso da atenção, pois é aqui que efetivamente nosso cérebro decifra as informações recebidas e se prepara para o processo de armazenamento.
Armazenamento: este é o momento onde recebemos as informações que foram previamente decodificadas e guardamos em locais específicos. Ou seja, informações visuais ficam em um local diferente das auditivas e assim por diante.
Recuperando informação: Aqui existem dois comportamentos que se dividem em memória de curto e longo prazo. Basicamente na primeira, conseguimos manter grupos de informações, que são acessadas, por um curto período (em média 18 segundos). Com prática e maior envolvimento estas informações podem entrar na ‘caixa’ das de longo prazo. Estas, por sua vez, são geralmente acessadas por gatilhos específicos (um cheiro, uma música…).
Depender da memória de longo prazo para executar funções pode se tornar algo extremamente exaustivo para o usuário, neste sentido é interessante procurar um caminho comum ao usuário, ao invés de depender do grande esforço desprendido para acessar a memória de longo prazo.
Linguagem
Assim como nossa ‘linguagem falada’, as palavras escritas também podem ser interpretadas como códigos. Estes, possuem o propósito de criar um significado através de diferentes linguagens que possibilitam a comunicação por um processo cognitivo onde: ‘aprendemos, entendemos, produzimos e compartilhamos um significado (a comunicação).’
O processo cognitivo da linguagem é um fator de extrema importância no Design e para isso precisamos compreender: Quem, quando, porque ou como na hora de idealizar um fluxo, tela, jornada; Apenas desta maneira conseguimos possibilitar que usuários atinjam seu objetivo.
Diferente do mundo real, quando falamos de um sistema, estamos nos comunicando com usuários sem a possibilidade de interpretar aquilo que desejam no momento em que desejam. E por isso, é primordial conhecermos para quem estamos desenhando, o que realmente buscam (seus objetivos) e também os problemas deste usuário. Desta maneira utilizamos da linguagem correta para gerar comunicação.
Raciocínio
‘É o Processo cognitivo responsável por avaliar, gerar argumentos lógicos, verificar fatos e assimilar, acomodar e rejeitar novas informações baseadas no nosso conhecimento existente’ (Interaction Design Foundation).
Com isso conseguimos explorar, ainda, que o conceito de lógica versus raciocínio, apesar de serem frequentemente tratados como algo único, são diferentes:
- Lógica é a aplicação de regras, normas e heurísticas durante o raciocínio;
- Raciocínio é o processo como um todo, até mesmo levando para direções que não seriam ‘lógicas’, como por exemplo, escolher ações incorretas de propósito.
Com a definição de ambos, e explorando mais a fundo o conceito de raciocínio nos deparamos com um caminho que pode seguir em duas direções e trazer clareza sobre ambos pode nos auxiliar nas interações diárias com usuários e suas necessidades.
- Dedutivo: É o primeiro conceito e que possui um alto grau de certeza com base em fatos concretos. Como exemplo podemos trazer uma situação da vida real. Imagine-se em um lugar onde ocorre uma mudança brusca de temperatura. Neste caso, sempre que isso acontece você pega um resfriado. Ou seja, pode-se deduzir com base em fatos concretos que a probabilidade de ficar resfriado com esta mudança é alta.
- Indutivo: Em contrates, este conceito traz uma baixa certeza, inferências e parte da observação. Um exemplo clássico, citado por Marques (2020) é o seguinte:
‘Cobre conduz energia. Zinco conduz energia. Cobalto conduz energia. Ora, cobre, zinco e cobalto são metais. Logo, (todo) metal conduz energia’
Importante salientar que o que diferencia ambos os conceitos é que no modelo dedutivo é vital a existência de hipóteses já confirmadas sobre o assunto. Enquanto o modelo indutivo se baseia em gerar soluções possíveis que, em sua maioria, são inferências.
Solução de problemas
‘Processo mental envolvido no desenvolvimento de ideias, estratégias e comportamentos que nos ajudam a atingir nossos propósitos e objetivos.’
Para exemplificar, podemos dividir a ‘solução de problema’ em três pontos essenciais:
- Objetivos direcionados: O comportamento para a solução de um problema é gerado através da ligação com um objetivo primário. Por exemplo, com o objetivo primário de escrever, temos um direcional que seria pegar uma caneta.
- Decomposição de Sub-objetivos: Quanto mais complexo um problema, mais sub-níveis de objetivos direcionados são criados. Ex. Para desenhar precisamos pegar um papel, pesquisar referências, escolher as cores…
- Ações sequenciais: Para executar os sub-níveis de objetivos é necessário tomar um conjunto de ações, na sequência correta. Ainda utilizando o desenho como exemplo, de nada adianta ter todas as cores(ex. tinta) a sua disposição se você ainda não possui o pincel, ou a ideia do que pintar.
Desconstruindo a solução de problemas, podemos compreender como facilitar a jornada de um usuário. No entanto, o ponto principal aqui é justamente fortalecer esta jornada. Isto porque após algum tempo nos acostumamos com as etapas e elas se tornam — inconscientemente — um único passo para executar uma ação.
Exemplificando, podemos pensar que é como andar de carro, nos primeiros momentos precisávamos separar todos os passos, mas conforme vamos nos tornando hard users não percebemos mais estas etapas.
No entanto, qualquer mudança sutil neste processo nos faz voltar à origem e decompor todos os passos desta jornada. O trabalho do Designer, então, está em compreender isto e ‘diminuir o tempo e esforço’ de prática/repetição para automatizar processos.
Tomada de decisões
Avançando, compreender a diferença entre solução de problemas e tomadas de decisão é de suma importância para compreendermos o processo de cognição. Para isso podemos explorar ambos os conceitos da seguinte maneira:
Solução de problemas sendo a capacidade de gerar comportamentos para resolução de problemas.
Tomada de decisões sendo um fator de seleção entre ‘as melhores opções’ nas resoluções geradas.
Diariamente, sem perceber, tomamos inúmeras decisões, desde pequenas à grandes. Com isto, estamos pesando constantemente as opções procurando compreender quais nos trazem maior benefício. Processo este que consome energia e que nosso cérebro procura evitar, automatizando, o máximo de decisões possíveis.
Atualmente você não se preocupa em desconstruir a sua jornada para escovar os dentes, mas com certeza investe um tempo considerável escolhendo qual roupa irá utilizar para uma reunião.
Além disso, selecionar uma roupa para vestir pode parecer algo simples, principalmente por crenças — já refutadas — de que nosso processo de escolha é totalmente racional. No entanto, o nível de energia que dedicamos à cada decisão pode ser descrito como algo extremo. Isto porque, como comprovado pela noção de ‘tomada de decisão subjetiva’, nos baseamos mais em ‘fatores emocionais, disposicionais, sociais e situacionais’. Estes, que por sua vez, consome muito mais energia do nosso cérebro.
Conclusão
Trazendo isto para a realidade de um profissional de UX, podemos interpretar que o processo de decisão da maioria das pessoas está mais relacionado a minimizar perda do que potencializar ganhos. Pensando em um usuário que está iniciando sua jornada em um novo sistema, esta pessoa irá — por conta dos fatores emocionais citados — evitar ao máximo se expor à riscos e portanto irá explorar menos o sistema. Ou seja, compreender funcionalidades e como levamos os usuários até elas são um fator crítico no simples ponto de proporcionar uma imersão e aprofundamento do sistema. Fato este que pode ocorrer, mesmo sem a noção do usuário, de que isto está acontecendo.
Material produzido com base no curso de Psychology of Interacion Design oferecido pela IDF. Para conhecer mais sobre o curso, acesse aqui.
Referências
Créditos/Fonte: uxdesign